Dep. Fed. Chico Alencar
Boa parte dos 318 deputados – a maioria da base do governo – que disseram SIM à criação da Previdência Complementar Privada para servidores públicos praticou uma fraude política ao renegar posições históricas de seus partidos. Nesta noite dos paradoxos, os tucanos e Maluf – entusiasmado aliado do PT – foram dos poucos coerentes… com o privatismo que sempre defenderam. A cidadania crítica deve ter consciência de alguns aspectos importantes na criação do Funpresp:
1) em nenhum momento da campanha eleitoral, nem em qualquer documento escrito, a então candidata Dilma Roussef mencionou este projeto, que agora, no governo, assumiu como “imprescindível e prioritário”. A honestidade democrática impõe que se pratique no governo o que se afirma na campanha. Não foi o caso: ao contrário, nas pouquíssimas menções no programa de governo e no discurso de posse, a presidenta reafirma “a defesa da previdência social pública”. Essa mudança de posição de alguns partidos é, portanto, um estelionato eleitoral;
2) foi atribuída aos servidores, covardemente, a responsabilidade pelo histórico desvio de recursos da Previdência, recursos esses utilizados para, lá atrás, construir Brasília, pontes (como a Rio-Niterói) e, mais recentemente, para fazer superávit primário e pagar juros e serviços da dívida, tudo inteiramente à revelia dos próprios servidores;
3) classificou-se como “elite privilegiada” servidores públicos fundamentais como auditores, promotores, defensores, fiscais, magistrados, assessores legislativos e professores universitários, nivelando por baixo as expectativas de carreira, sem com isso abrir qualquer perspectiva de melhoria para a grande parcela dos servidores mais mal remunerados;
4) cumpriu-se, afinal, uma obscura ‘carta de intenções’ ao FMI escrita em 2003, para ‘acalmar os mercados’, sem qualquer aval da população brasileira;
5) na linha do privatismo e do ajuste fiscal, o Estado brasileiro vai se desincumbindo da aposentadoria integral dos seus servidores;
6) estabeleceu-se o absurdo da ‘contribuição definida com benefício indefinido’;
7) na melhor tradição neoliberal, em crise no mundo inteiro, entregam-se recursos públicos para o capital financeiro gerir, transformando previdência, que é sinônimo de segurança, em aplicação de risco;
8) a gestão desse(s) Fundo(s) será temerária, não estando nada assegurado – nem sua transparência nem seu controle por parte dos servidores, para gáudio da banca especulativa;
9) os bancos passarão décadas só arrecadando recursos e não terão responsabilidade pelo pagamento de benefícios;
10) quebra-se o princípio da solidariedade entre gerações, para se estabelecer o do individualismo e da continuidade da contribuição para se obter uma improvável compensação.
A incoerência presente já é manifesta e comprovada. O tempo dirá, no futuro, quem esteve do lado da defesa dos direitos dos servidores públicos e quem operou na direção de sua desvalorização.
Agradeço a atenção,
Sala das Sessões, 29 de fevereiro de 2012.
Chico Alencar
Deputado Federal, PSOL/RJ.