31 DE MARÇO – é um dia para lamentar!

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Num país, algumas datas são para celebrar. Outras, para lamentar. O dia 31 de março é para lamentar.

Há 51 anos, uma conspiração destruiu uma democracia com o argumento cínico de que estava exatamente preservando a democracia. O que havia de mais atrasado na sociedade da época se juntou na trama: militares, CIA, políticos conservadores e grandes empresários do jornalismo, como os Mesquitas, Roberto Marinho e Octavio Frias de Oliveira.

A administração que nasceu dessa aliança foi um colosso da inépcia. O Brasil piorou dramaticamente – excetuado o pequeno grupo que tomou conta do Estado.

A desigualdade floresceu.

O País se favelizou. Conquistas trabalhistas foram extirpadas, como a estabilidade. Greves – a única arma dos trabalhadores – foram proibidas. O ensino público que era excelente – e promovia a mobilidade social – foi devastado, com a perseguição a professores e o controle obsceno do que era ensinado nas salas de aula.

O Brasil deu um passo gigantesco para trás em 31 de março de 1964. Os generais presidentes – Castelo Branco, Costa e Silva, Médici, Geisel e Figueiredo – merecem um esculacho eterno.

Falavam em combater a corrupção dos civis e não conseguiram criar em seu partido, a Arena, nada que fosse além de Paulo Maluf. Foram mais de 20 anos de pesadelo.

Alguns cúmplices dos militares acabaram também se dando mal. Carlos Lacerda, o eterno conspirador, queria que eles derrubassem João Goulart e preparassem o terreno para que ele, Lacerda, ascendesse à Presidência.

Os Mesquitas foram obrigados a publicar receitas para ocupar o espaço de textos censurados. Frias foi submetido à humilhação de receber uma ordem telefônica para demitir o diretor de redação Cláudio Abramo, e obedeceu.

Passou.

Mas é bom não esquecer que 31 de março é um dia para lamentar O golpe de 1964 fez o Brasil dar um passo gigantesco para trás. (DIÁRIO DO CENTRO DO MUNDO)

Vítimas da ditadura mostram revolta com pedidos de intervenção militar

Clínicas do Testemunho atendem 140 pessoas que sofreram com o regime.
‘A ditadura é a lei do inferno’, diz militar torturado por elogiar Brizola.

Em um supermercado da Zona Norte do Rio, Belmiro Demésio Berraro Filho, de 68 anos, ouve na fila uma mulher reclamando da corrupção no país. Em certo momento, ela se vira e diz que é a favor da intervenção militar, pedida por uma minoria durante manifestações do dia 15 de março em todo o país – neste sábado (28) um pequeno grupo fez outra passeata pelo Centro do Rio. A reação foi contundente.
Faixas pediram a intervenção militar em protestos do dia 15 de março

“A senhora foi presa, perdeu filhos, pais, mães nos porões? A senhora não sabe o que está falando. Ditadura é a lei do inferno. Eles respondem com morte, com fogo, terror e maldade”, lembra-se Belmiro, em entrevista ao G1.

Ele é uma das 140 pessoas atendidas pelas Clínicas do Testemunho, da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, que forma núcleos de apoio e atenção psicológica aos afetados pela violência do estado durante a ditadura militar. Aplicado há dois anos e em parceria com a Comissão da Verdade – que investiga crimes da ditadura –, o projeto instalou cinco clínicas nesta primeira etapa: duas em São Paulo e uma em Porto Alegre, Rio e Recife.

Segundo o relatório final da Comissão Nacional da Verdade, o número de mortos e desaparecidos durante a ditadura militar chegou a 434: 210 desaparecidos, 191 mortos e 33 corpos encontrados. Foram responsabilizados 377 agentes das Forças Armadas.

Belmiro foi um dos 3.340 militares da Aeronáutica perseguidos. Ele conta que o sonho de ser aviador servindo ao país foi interrompido em 1969, quando perguntado por outro militar a respeito de Leonel Brizola, então ex-governador do Rio Grande do Sul – depois governou também o Rio de Janeiro – e um dos maiores representantes da esquerda. Ao responder que “nenhum político da época chegava aos pés”, caiu em uma armadilha quase fatal.

“O capitão me chamou, e na sexta-feira à tarde já estava preso. Passei 15 dias dentro de um inferno. Fui poupado da morte. Fui colocado no chão e fui levado para ser sacrificado por ser subversivo, comunista e elemento perigoso para a pátria. Quando houve o disparo de fuzil na minha cabeça, a bala não pegou nela. Bateu na relva, do lado da minha cabeça. Fui penalizado com torturas, recebi um chute na minha testa com bota que me rendeu uma cicatriz até hoje, urinaram no meu peito, fui humilhado. Mas estou vivo”, conta, emocionado.

Fui penalizado com torturas, recebi um chute na minha testa com bota que me rendeu uma cicatriz até hoje, urinaram no meu peito, fui humilhado. Mas estou vivo”

Belmiro Demésio, vítima da ditadura

Após quatro anos se dividindo entre o Rio Grande do Sul e Santa Catarina, veio para o Rio em 1973, onde vive até hoje. Os pedidos pela intervenção militar na passeata contra a corrupção na Petrobras e pelo impeachment de Dilma Rousseff, na Praia de Copacabana, causou revolta. “Eles não têm noção do que é viver dentro dos muros de um quartel, dentro de um inferno. Prometeram em 1964 que haveria novas eleições e elas nunca existiram”, lembra.
Clínica como política de estado
Jane Alencar, de 64 anos, também é atendida pelas Clínicas da Testemunho, que a Comissão da Verdade do Rio, em seu relatório parcial, ao qual o G1 teve acesso, recomenda à Comissão Nacional da Verdade que seja transformada em política de Estado. Para ela, defender a intervenção revela “um profundo desconhecimento da história do Brasil”.
“Tivemos duas ditaduras, com Getúlio Vargas e civil-militar, que só deixaram marcas de dor e retrocesso. Essas pessoas deveriam estudar um pouco a história do nosso país e ver que a democracia tem falhas, limitações. É um processo lento e dificil, mas não existe melhor alternativa política.”

Jane diz que foi detida três vezes durante a ditadura, teve de encarar uma das mais temidas prisões do período: o prédio do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS-RJ), localizado na rua da Relação. Quando foi presa pela primeira vez, tinha entre 16 e 17 anos.

“Fui presa porque, em uma, eu era militante da JEC [Juventude Estudantil Catolica], ligada à Teologia da Libertação. Na outra, porque era militante do movimento estudantil de resistência à ditadura. Em outra vez, dava aulas para pessoas carentes em Oswaldo Cruz. Fui presa pelo Cenimar [Serviço de Informações da Marinha] no prédio da Marinha, perto da Praca Mauá, e muito torturada”, conta Jane, que diz sofrer até hoje com dores agudas e intensas pelo corpo, doenças autoimunes, instabilidade emocional e insônia.
“Muitas dessas vítimas jamais tinham falado com qualquer pessoa sobre tortura”

Vera Vital, psicóloga da Clínica do Testemunho

“Quem sofreu essa prática sádica e covarde luta cotidianamente para superar essa sensação de tristeza e revolta.  As Clínicas do Testemunho têm dado uma colaboração fundamental na busca do fortalecimento e equilíbrio emocional. Queremos ainda a punição disso tudo.”

Segundo a psicóloga Vera Vital Brasil, que atende aos pacientes das clínicas, é em grupo que eles se sentem mais à vontade para falar.

“Uma das consequências mais graves da violência repressiva foi sobre os vínculos sociais, como família e amigos, e também com o Estado. Existe uma desconfiança muito intensa também na relação com os companheiros de militância. Muitas dessas vítimas jamais tinham falado com qualquer pessoa sobre tortura”, analisa Vera.

“Tortura silencia. E o estado brasileiro não criou dispositivos para ouvir essas pessoas. É essa lacuna que queremos preencher, pedindo ao estado brasileiro que disponibilize esse dispositivo”, afirmou.
O presidente da Comissão da Verdade do Rio, Wadih Damous, diz que a experiência das Clínicas do Testemunho deveria se estender a todo o território brasileiro. “A violência não foi só física, ela deixou sequelas psicológicas nos filhos, maridos, esposas que ficaram. No Chile é assim, na Argentina também e por disposição de lei. O estado lá tem obrigação de prestar assistência. E já passou da hora disso acontecer aqui.”
Recomendações da Comissão da Verdade
Entre as 28 redomendações do relatório parcial da Comissão da Verdade do Rio, estão a  criação de de Espaços de Memória sobre a ditadura em pontos estratégicos, como o DOPS/RJ, a Casa da Morte, em Petrópolis, a Ilha das Flores, em São Gonçalo, o estádio Caio Martins, em Niterói, entre outros.

A violência não foi só física, ela deixou sequelas psicológicas nos filhos, maridos, esposas que ficaram”

Wadih Damous, presidente da Comissão da Verdade do Rio

Além disso, há a recomendação da tipificação do desaparecimento forçado, um dos métodos de repressão mais característicos da ditadura militar, e de retificação das certidões de óbito dos assassinados pelo regime com a real causa mortis. O documento também pede a extinção jurídica do termo auto de resistência, usado frequentemente para encobrir casos de abuso e execução de civis por agentes do estado.
“São termos que mostram que a ditadura ainda vive em nossos tempos. São tempos passados que não passam”, explicou Damous.

O documento ainda pede a revisão da Lei de Anistia, assinada em 1979, que perdoa os crimes cometidos por militantes políticos e agentes do estado durante a ditadura.
A Comissão da Verdade do Rio, em seu relatório parcial, destacou momentos importantes, como o depoimento de Paulo Malhães, oficial que foi responsável, entre outros crimes, pelo desaparecimento do corpo de Rubens Paiva. A investigação descobriu, através do depoimento do coronel reformado Raimundo Ronaldo Campos, que confessou ter levado um carro a um ponto distante e o queimado. Depois, soube que aquilo havia sido feito para “justificar o desaparecimento de Rubens Paiva”.
Malhães, torturador confesso, deu detalhes no dia 11 de março sobre o destino do corpo de Rubens Paiva, que foi jogado em um rio de Itaipava, na Região Serrana do Rio. Pouco mais de um mês depois, foi encontrado morto em sua casa na Baixada Fluminense. A polícia concluiu, em julho do ano passado, que Malhães foi vítima de latrocínio.

Fonte: O GLOBO

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