As flagrantes injustiças sociais que vigoram no Brasil afetam toda a sociedade. Apesar de sermos um dos países mais ricos do mundo – atualmente 7ª maior economia do planeta – o Brasil amarga inaceitáveis indicadores sociais, tais como:
Pior distribuição de renda do mundo;
- 79º no ranking de respeito aos Direitos Humanos – IDH – segundo relatório divulgado pela ONU;
- Penúltimo no ranking da Educação (Índice Global de Habilidades Cognitivas e Realizações Educacionais);
- 128° no ranking do crescimento econômico.
A injusta situação social do país afeta principalmente às mulheres, tendo em vista que o Brasil possui a quinta maior população mundial, e que as mulheres já são maioria, constituindo 51% da população nacional.
A pobreza e a inexistência ou insuficiência de atendimento aos direitos sociais previstos no art. 6o da Constituição Federal – educação, saúde, alimentação, trabalho, moradia, lazer, segurança, previdência, proteção à maternidade e à infância, assistência aos desamparados – atinge fundamentalmente às mulheres. São elas as primeiras a serem demitidas, e as mais sacrificadas quando faltam serviços essenciais. A luta por igualdade de oportunidade de acesso a postos de direção e políticos também tem sido árdua para as mulheres, embora ocupemos a maioria das vagas nas universidades brasileiras.
Apesar de existirem políticas específicas de atendimento aos direitos das mulheres, a destinação de recursos para tais políticas, por parte do governo federal, tem caído nos últimos anos. O quadro a seguir compara dados de 2013 e 2014, e mostra uma queda de quase 20% na destinação de recursos para as ações referentes a Políticas para Mulheres:
A maioria das ações são referentes ao combate à violência doméstica devido às disposições da Lei Maria da Penha . Na prática, tal lei tem se tornado inócua na maior parte do país, devido à inexistência dos instrumentos essenciais à sua efetividade, especialmente as casas-abrigo e creches. Torna-se impossível para uma mulher vítima de violência doméstica poderá denunciar seu agressor/companheiro e retornar para a mesma moradia junto com ele.
Mas as atuais demandas dos movimentos de mulheres vão muito além dessa questão: exigimos justiça social, conforme direitos consagrados na Constituição Federal, e dignidade de vida para todas as pessoas.
Temos razões de sobra para essas exigências; não só devido à previsão constitucional, mas também tendo em vista o fato de contribuímos de forma decisiva para o financiamento de políticas públicas, por meio da elevada carga tributária que recai sobre a classe trabalhadora e sobre os mais pobres.
A dura realidade é que apesar de sermos um dos países mais ricos do mundo e de arcarmos com pesada carga tributária, os direitos sociais previstos na Constituição Federal não têm sido devidamente proporcionados pelo Estado, penalizando de forma contundente às mulheres. Diversas razões históricas explicam esse inaceitável paradoxo, porém, nas últimas décadas, o principal responsável tem sido o Sistema da Dívida, que a cada ano absorve quantias exorbitantes para o pagamento de questionáveis obrigações financeiras vinculadas a dívidas que nunca foram auditadas.
O gráfico a seguir retrata a destinação dos recursos do Orçamento Geral da União Executado em 2014 e mostra que a dívida pública é a principal responsável pelo não atendimento das necessidades urgentes do povo brasileiro. O valor destinado às Políticas para Mulheres em 2014 ficou 8.655 vezes menor que os R$ 978 bilhões gastos com juros e amortizações da questionável dívida pública federal.
Orçamento Geral da União (Executado em 2014) Total = R$ 2,168 trilhão
O ORÇAMENTO FEDERAL proposto pelo Executivo para 2015 reserva R$ 1,356 trilhão para os gastos com a dívida pública, ou seja, 47% de tudo que o país vai arrecadar com tributos, privatizações e emissão de novos títulos, entre outras rendas. Este valor representa, por exemplo, 13 vezes os recursos para a saúde, 13 vezes os recursos previstos para educação ou 54 vezes os recursos para transporte.
Estes dados denunciam a necessidade de maior envolvimento dos movimentos feministas no controle dos gastos públicos e no conhecimento do “Sistema da Dívida”, uma engrenagem que absorve elevados montantes de recursos públicos de forma contínua, transferindo-os principalmente para o setor financeiro privado nacional e internacional.
A dívida externa brasileira supera 549 bilhões de dólares e a dívida interna federal passa de 3,071 trilhões de reais. Há muito tempo o endividamento público deixou de ser um mecanismo de financiamento do Estado e passou a ser um veículo de subtração de elevados volumes de recursos orçamentários, e subtração de patrimônio pela imposição contínua de privatização de áreas estratégicas como petróleo, portos, aeroportos, estradas, energia, saúde, educação, comunicações, entre outros.
Por isso lutamos pela auditoria dessa dívida, conforme previsto na Constituição de 1988 – violada há 26 anos – para apurar os inúmeros e graves indícios de ilegalidades, tais como: a aplicação de juros sobre juros (prática considerada ilegal pelo Supremo Tribunal Federal); evidências de conflitos de interesses na definição das taxas de juros, face à influência direta de agentes do mercado financeiro; relevantes danos ao patrimônio público em sucessivas negociações da dívida externa e interna que nunca chegaram a ser auditadas; falta de transparência na publicação dos juros nominais efetivamente pagos; contabilização de grande parte dos juros nominais (despesa corrente) como se fossem amortizações (despesa de capital); violação dos direitos humanos e sociais, dentre muitos outros crimes já denunciados por comissões do Congresso Nacional, principalmente durante a CPI da Dívida Pública realizada em 2009 na Câmara Federal.
Nossa participação institucional na CPI da Dívida no Brasil e na Comissão de auditoria oficial da dívida do Equador foram as principais tarefas já desempenhadas pela Auditoria Cidadã da Dívida. O Equador conseguir reduzir 70% da dívida externa em títulos, o que possibilitou triplicar os investimentos sociais. No Brasil, o efetivo resultado virá somente a partir de efetivo engajamento social. Os movimentos de mulheres têm importante papel a cumprir também nesta seara. Vamos à luta, amigas. Participem dos núcleos da Auditoria Cidadã que estão se formando em diversos estados brasileiros e ajudem na socialização do conhecimento sobre a realidade financeira do país, transformando esse conhecimento em ferramenta de luta social.
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*Fonte: artigo escrito pela Coordenadora Nacional da Auditoria Cidadã da Dívida, Maria Lucia Fattorelli.